quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Ela nasceu

Não existe apenas um cordão umbilical. Há o mais famoso: o de carne, que perdemos ao nascer. Mas ser filho é ter outro. É o cordão invisível que nos prende à mãe: o da alma.
É triste, mas só percebemos a existência do último quando a perdemos. Por isso eu peço: não duvide de quem já perdeu. Não espere para ter certeza. Dou garantia: ele existe.
Ao perder o grande amor sentimos um vazio; sensação de que fomos roubados - violentamente. E fomos: cortaram o nosso último cordão.
Perdê-la é, de alguma maneira, tornar-se livre. Mas a vontade que dá é pedir o retorno da prisão. É mentira que homem nasce para a liberdade. Lugar algum é melhor que os cercos do colo da mãe, que é família, fortaleza inteira.
Para quem ainda a tem, viver deve ser beijá-la: de manhã, de tarde, à noite. Vale acordar, também, de madrugada. Morte é salteador eficiente; nunca se sabe quando pula nossa janela.
Mas para quem já sofreu o crime mais doloso, o conforto é o espelho: vê-la em si. Teus olhos são os dela, como a pele e a vontade. Se ela cuidou, cuidarás também. Porque se ela era tudo, torna-te uma mãe para o mundo: deve haver outros cordões em ti.

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