sexta-feira, 27 de junho de 2014

A culpa é das estrelas, não da vaca

Minha namorada me arrancou ao cinema. O filme, “A culpa é das estrelas". Eu não queria assistir, porque já sabia tratar-se de coisa triste. Mas fui e vi. Durante ele, me perguntava desde quando eu era tão menina.

A garota do casal é do tipo mulher mais linda de todos os tempos. Com tubinhos e tudo mais. Tanta mulher se preocupa com o formato do brinco… Mas ela é linda, mesmo que de hospital. O rapaz, me nego a elogiar a feição - só digo que é risonho de tudo; não sei se é por isso, mas ela gosta dele. Assim, tudo fica bem falado. Triste é que os dois têm câncer.

Voltemos para a minha meninice: sempre que os dois se envolviam em algum tipo de carinho e eu, sabedor das condições descritas na história, e lembrando da minha, danava-me a querer chorar. Inventei, então, um artifício. Era assim: eu mentalizava uma vaca no pasto. Uma declaração de amor? Vaca no pasto. Um olhar apaixonado? Vaca no pasto. Sequer uma lágrima brotou dos olhos; seja do esquerdo, ou do direito. Me sentia um homem de verdade.

Não é que dê vontade chorar por uma sessão da tarde. Só que o que vi não é uma novelinha clichê. Foi um lembrete para minhas emoções desordenadas. Porque emoção é assim: uma vez dispostas fora do lugar, nunca mais têm as gavetas arrumadas. É furacão dentro de si. Mas há quem dome tudo.

Lembrei de uma cena em que a vaca no pasto não foi suficiente. Diante do prenúncio do choro, quando quase derramava, fui maroto - sapeca, ou qualquer outro adjetivo brega que sirva à frase - e pus um mugido na imagem. Vaca no pasto mugindo! Era, de novo, homem de verdade.

Foi com esse esforço que fui até quase ao fim. Percebi um filme sobre coragem. Digo, coragem não, porque é forma masculina e menor que outra virtude. Mulher tem em sua forma temperada: coragem de mulher é esperança.

Anne Frank disse, em 25 de março de 1944: “A gente não faz ideia de como mudou até que a mudança já tenha acontecido. Eu mudei de um jeito drástico, tudo em mim é diferente: minhas opiniões, minhas ideias, a visão crítica. Por dentro, por fora, nada é igual. E posso acrescentar com segurança, já que é verdade: mudei para melhor.”.

Eu tinha lido o melhor diário alemão, sublinhado esse parágrafo. Não tinha como não me envolver com a personagem do filme. A qualidade de uma história depende muito da nossa: se é mamão com açúcar ou não, não importa. Bom é reconhecer-se, de alguma forma, no que ela narra. Vi nela, em mim, um tipo de mudança.

É uma bobagem isso de homem não chorar em filme de amor - ou de esperança. Bobagem maior é não poder chorar em filme de adolescente. Viver é acumular memórias; o que nos torna frágeis. Mas se fui capaz de elogiar a coragem, adornando-a, para adequá-la ao valor de uma mulher, por que deveria ter vergonha do choro, escanteando-o, como fosse coisa proibida aos homens?

Perto dos créditos minha querida vaca no pasto foi embora. Abri mão de outros artifícios - bezerros de patins ou cisnes puladores de corda. Chorei, como bebê que pede. Antes eu teria vergonha. Mas sou emotivo mesmo. E minhas qualidades de homem nunca foram comprometidas por causa das lágrimas. Acabado o filme, sai ganhando: um selinho dela na sala escura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário